CONFEDERAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES ECONÓMICAS DE MOÇAMBIQUE

CONFEDERAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES ECONÓMICAS DE MOÇAMBIQUE

Impacto das decisões do Banco de Moçambique na dívida privada interna

Impacto das decisões do Banco de Moçambique na dívida privada interna

O Banco de Moçambique voltou a aumentar nas taxas de referências do mercado. Segundo o seu comunicado de 21 de Julho, em face do comportamento atípico dos principais indicadores macroeconómicos do país, com destaque para a inflação e a taxa de câmbio e, perante necessárias correcções a fazer à sua trajectória, o Comité de Política Monetária do Banco de Moçambique julgou adequado reforçar a postura anticíclica da política monetária tendo decidido incrementar as taxas de juro das Facilidades Permanentes de Cedência de liquidez (FPC) de 14,25% para 17,25% e Facilidade Permanente de Depósitos (FPD), de 7,25% para 10,25%, assim como ajustar o coeficiente de reservas obrigatórias em moeda nacional de 10,50% para 13,0%, com efeitos a partir do período de constituição que inicia a 22 de Agosto de 2016.
Olhando para os argumentos do Banco de Moçambique (BM) para a tomada destas medidas, serão eles convincentes? Que impacto pode-se esperar destas medidas?
Sob ponto de vista dos argumentos, o aspecto central tem como objectivo o controlo de inflação. Entretanto, o próprio BM refere que a aceleração dos preços é explicada, entre outros factores, pela redução da oferta de frutas e vegetais, no quadro da desaceleração do crescimento económico motivado por choques naturais (cheias e estiagem) e por efeito de constrangimentos na circulação de pessoas e bens como resultado da tensão militar na região centro do País.
Com a disponibilidade de produtos a reduzir no mercado, o BM vê-se na obrigatoriedade de reduzir a quantidade de dinheiro que circula na economia. Uma das formas mais rápidas de reduzir o dinheiro que circula é através do coeficiente de Reservas Obrigatórias (RO´s) que incide no total dos depósitos mobilizados em cada período na economia, significando que a sua eficácia está dependente do fluxo periódico dos depósitos. Ou seja, o BM só conseguirá absorver maior quantidade do dinheiro em circulação somente se esse dinheiro for depositado e, a partir daí, ser canalizado ao BM, na base da taxa percentual das RO´s. Olhando a figura sobre fluxos do Crédito e Depósitos totais na economia apercebe-se que o fluxo de constituição de depósitos na economia baixou em 2016, com destaque para o I Trimestre de 2016 onde a diferença entre os depósitos totais daquele período e do respectivo antecedente, IV Trimestre de 2015, é negativo. Isto pode significar duas coisas: a primeira pode ser um indicativo do impacto da subida das RO´s de tal forma que o nível de depósito constituído no período seguinte não seja suficiente para compensar o valor enxugado pelo BM através da taxa de RO´s; mas, também, pode ser um indicativo de que o dinheiro está a sair do sistema, reduzindo o stock total de depósitos no sistema.

Para perceber, a taxa de RO´s subiu de 8,0% para 10,5% de Outubro a Dezembro de 2015. Como resultado, o BM conseguiu enxugar o dinheiro em circulação no valor de 1 815,90 milhões de Meticais. Entretanto, de Janeiro a Março, período no qual não houve alteração da taxa de RO´s, conseguiu enxugar 543,36 milhões de Meticais e no período seguinte, de Abril a Maio enxugou apenas 190,55 milhões de Meticais. Portanto, havendo queda do fluxo dos depósitos, o BM não poderia conseguir enxugar o dinheiro ao nível desejado e estabilizar os preços, dada a redução da disponibilidade de produtos no mercado devido aos choques exógenos. Aqui vê-se que a taxa de RO´s não foi tão eficaz quanto se esperava, dado que o fluxo de depósitos reduziu no período de constituição das Reservas Obrigatórias. Em outras análises, o BM devia procurar a razão desta redução.
Em relação às outras taxas de referência, nomeadamente, a FPC e FPD o grande objectivo é limitar a expansão do crédito e atrair as poupanças. Mas, qual é o racional?
O BM não conseguindo enxugar o dinheiro que está no sistema porque o fluxo dos depósitos baixou, então assume que esse dinheiro vai pressionar o aumento da procura de produtos, numa situação na qual a produção está a reduzir. Como resultado, a inflação vai acelerar. Então, para travar esta aceleração de inflação, aumenta a FPC que vai levar ao aumento da prime lending rate (PLR), a taxa base de empréstimos ao sector privado na economia.

Como pode-se ver na figura, a PLR saiu de 14,31% em Outubro de 2015 para 21,78% em Maio de 2016. Qualquer empréstimo concedido até essa data, custava 21,78% +spread que pode atingir até 9,0% em média , no mesmo período em que a FPC saiu de 7,5% para 14,25%. O aumento da PLR vai tornar caro qualquer empréstimo concedido e, qualquer agente económico vai pensar duas vezes para solicitar um empréstimo, reduzindo um fluxo do crédito à economia.
O aumento da FPD, por sua vez, vai influenciar o nível da taxa de juro de depósito. Até Maio, segundo o BM, esta taxa estava em 12,93% contra 12,11% em Outubro de 2015, o que significa que quem poupa passou a ganhar um juro ligeiramente mais alto.
Comparando a influência que, tanto a FPC e FPD exercem sobre o nível de taxas de juro, nota-se que o aumento da FPC reflectiu-se, rapidamente, sobre o nível de taxa de juro de empréstimos ao provocar uma subida de 6,97 pontos percentuais (pp) do que a FPD sobre a taxa de juro de depósitos que subiu, apenas, 0,82 pp.
O impacto das medidas do BM não se reflecte, apenas, nos novos empréstimos ou depósitos. Há, ainda, que considerar o dinheiro em mãos de muitas empresas e cidadãos emprestado pelos bancos comerciais, antes da subida da taxa de juro. Tendo em conta que, quem vai pedir empréstimo a taxa de juro é PLR+spread, significa que determinada empresa que tenha pedido empréstimo antes das medidas, pagava 14,31%+spread e hoje paga 21,78%+spread.
Até Setembro de 2015, antes do início do ciclo de subida da taxa de juro, o total de crédito concedido ao Sector Privado situava-se em 171 021,3 milhões de Meticais, que equivale ao stock total da dívida interna do Sector Privado, excluindo os juros que, comparando com o PIB de 2015, estimava-se em 30% do PIB. Se assumirmos um prazo médio de vencimento de 5 anos para aquela dívida, então com PLR=14,31% o total do envidamento privado em Moçambique estaria estimado em 240 414,34 milhões de Meticais incluindo os juros, cerca de 40% do PIB e o respectivo serviço da dívida estaria estimado em 69 393,04 milhões de Meticais, cerca de 11,8% do PIB. Com a subida da taxa de juro, o endividamento privado, assumindo o mesmo prazo médio de vencimento, passaria de 240 414,34 para 279 220,71 milhões de Meticais, cerca de 47,4% do PIB; o respectivo serviço da dívida aumenta de 69 393,04 para 108 199,41 milhões de Meticais, o que corresponde a 18,4% do PIB.
Em termos do serviço de dívida privada interna mensal passa de 4 006,91 milhões de Meticais para 4 653,68 milhões de Meticais, um aumento de 646,77 milhões.
Portanto, as medidas do BM têm o condão de aumentar o endividamento privado interno em Moçambique, que sai de 40% do PIB para 47,4%; e o respectivo serviço da dívida que sai de 11,8% para 18,4%. Mais ainda, a própria prestação mensal, portanto, o serviço da dívida, fica mais cara ao crescer em 646,77 milhões de Meticais. Ou seja, nos custos operacionais, o sector privado deve acrescer aquele valor em resultado da subida das taxas de juro.


Todos os dados usados neste artigo, excepto as estimativas da dívida privada interna e o respectivo se
rviço da dívida, estão disponíveis em http://bancomoc.mz/fm_pgLink.aspx?id=222

 

 

 

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