A política do salário mínimo e suas implicações no nível de desemprego tem se tornado um dos debates mais influentes da microeconomia moderna. Este debate tem sido cada vez mais intenso nas economias ocidentais onde as hipóteses discutidas constituem muitas das vezes importantes subsídios para os processos negociais entre os empregadores e as agremiações sindicais.
Vários estudos foram realizados a volta desta matéria, contudo, ainda não se chegou a um consenso. Em alguns casos a evidência indica que o salário mínimo aumenta o nível de desemprego e noutros casos a evidência sugere o contrário, ou seja, o salário mínimo não tem qualquer efeito no nível de desemprego. A fundamentação teórica para a primeira hipótese assenta, essencialmente, nos postulados do pensamento neoclássico que, por via de fundamentos microeconómicos, sugere que o salário mínimo cria distorções no mercado de trabalho e conduz a ineficiência económica. Este raciocínio tem esteio na ideia de que a política do salário mínimo impõe um nível salarial que suplanta a produtividade da força de trabalho e resulta na redução da procura por trabalho e consequente aumento da taxa de desemprego.
Embora não seja suficientemente ostensível, esta discussão é de capital serventia para os países que adoptam a política do salário mínimo como Moçambique. Assim, face ao exposto acima, e tendo em conta que este debate tem sido muito pouco explorado nas economias em desenvolvimento, com o presente texto pretende-se discutir o efeito do salário mínimo no nível de desemprego na economia de Moçambique, usando dados mensais do período de 2011-2017 .
Em Moçambique a política do salário mínimo foi legalmente instituída pelo artigo 108 da Lei do Trabalho de 2007 cujo fito é de garantir a equidade social e reduzir o índice de concentração do rendimento assegurando aos trabalhadores a protecção social suficiente para cobrir as mínimas condições de vida. Contudo, pouco tem sido discutido sobre os efeitos desta política no nível de desemprego em Moçambique, sendo que na literatura existente foi identificado apenas um estudo, realizado por Castel-Branco, el. al (2004), que apresenta uma discussão introspectiva a volta da política do salário mínimo e seu efeito no emprego e nos preços.
Neste estudo os autores adoptaram uma metodologia qualitativa baseada em inquéritos, a partir da qual concluíram que o salário mínimo tem um efeito desprezível no emprego e no nível de preços. Contudo, este estudo não transmite a sensibilidade económica e a percepção quantitativa da relação entre estas duas variáveis, pelo que, estes resultados podem não ser suficientemente consistentes com a realidade do país e podem induzir os fazedores de política a tomar decisões erróneas e economicamente inapropriadas.
Conforme se pode verificar através da Tabela 1, com o uso da abordagem quantitativa assente na estimação de um modelo econométrico que traduz a relação entre o salário mínimo e o nível de desemprego, nota-se que contrariamente a conclusão obtida no estudo de Castel-Branco, et. al. (2004), o salário mínimo tem uma relação estatisticamente significativa com o nível de desemprego.
Tabela 1: regressão simples da relação entre o salário mínimo e o nível de desemprego
Variavel | Coeficiente | P-Value | Estatistica t |
Salário Mínimo (log) | 1.686927 | 0.0000 | 5.270227 |
Constante | -3.617211 | 0.1823 | -1.345730 |
R^2 | 0.555094 |
Fonte: Eviews 7
De acordo com os resultados deste modelo, um aumento do salário mínimo em 1% resulta no aumento do nível de desemprego em aproximadamente 1.7%. Este resultado é consistente com os postulados da teoria microeconómica que sugere que a política do salário mínimo cria desequilíbrios no mercado de trabalho e pode levar a ineficiência económica.
Entretanto, considerando que este modelo pode ter sido afectado pela configuração do período de análise (2011-2017) que compreende uma fase de relativa ascensão e estabilidade macroeconómica (2011-2013) e um período de contracção do ritmo de crescimento económico e deterioração dos indicadores macroeconómicos (2014-2017), foi realizado um teste de estabilidade dos resíduos recursivos para avaliar a estabilidade do modelo ao longo deste período.
Gráfico 1: Teste de estabilidade dos resíduos recursivos

Fonte: Eviews 7
Conforme ilustra o Gráfico 1, a um nível de significância de 5% o modelo é estável, o que mostra que as diferenças nos ciclos económicos que se verificaram ao longo do período em análise (2011-2017) não afectaram de forma significativa a estabilidade do modelo estimado, pelo que, presume-se que os resultados deste modelo são consistentes e fiáveis.
Em suma, o presente texto pretendia discutir como o salário mínimo afecta o nível de desemprego em Moçambique usando dados mensais do período de 2011-2017. Nesta análise foi possível depreender que, conforme prevê a teoria microeconómica, o salário mínimo cria distorções no mercado de trabalho e induz o aumento do nível de desemprego, podendo ter implicações na eficiência económica e na equidade social.
Este resultado trás consigo a ideia de que no âmbito das negociações salariais não se pode olhar apenas para os benefícios que a política do salario mínimo pode trazer para a equidade social e redução da pobreza, mas também para os custos económicos a si associados, nomeadamente a perda de eficiência económica resultante das distorções que esta política causa no mercado de trabalho bem assim o aumento do desemprego que pode até agravar a desigualdade e o nível de pobreza, contrariando desta forma os objectivos que se pretendem alcançar com esta política.
Os dados mostram claramente que a medida que o salario mínimo aumenta o número de desempregados tende a aumentar. Por exemplo, em 2011 quando salário mínimo médio estava fixado em 3,132 MT o número de desempregados era de 22,403 trabalhadores, sendo que com a subida do salário mínimo em 2012 para 3,680 MT, o número de desempregados aumentou para 23,659 trabalhadores. O mesmo acontece nos anos subsequentes conforme ilustra a tabela 2.
Tabela 2: Salário mínimo médio e nível de desemprego
ano | desempregados | Salario Minimo Medio (MT) |
2011 | 22403 | 3132 |
2012 | 23659 | 3680 |
2013 | 28105 | 4052 |
2014 | 28670 | 4412 |
2015 | 32986 | 4779 |
Fonte: INE (Anuários estatísticos)
Portanto, há necessidade de se fazer uma análise custo-benefício na negociação do salário mínimo e alargar o âmbito de análise para uma visão mais agregativa. Isto é, é preciso ter em conta que ao aumentar o salário mínimo, embora os trabalhadores já empregues possam ter condições mínimas de vida asseguradas, a massa laboral não empregada perde o acesso ao emprego por decorrência do aumento dos custos das empresas que não os possibilita empregar mais trabalhadores ao nível salarial estabelecido. Portanto, esta análise despoleta a seguinte reflexão:
“Sob ponto de vista agregado, qual é o ganho na equidade social e redução da pobreza se através da política do salário mínimo asseguramos as condições mínimas de vida da massa laboral empregada e como consequência disso, a massa laboral desempregada (que representa a maior percentagem da população activa) perde o acesso ao emprego?”
Por: Roque Magaia